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Elza Soares: ‘‘Mulher do Fim do Mundo’’

sexta-feira 13 de novembro de 2020, por Franklim Peixinho,

Ela oferta a leveza de ser, o direito ao prazer que qualquer pessoa pode desejar e ter.

Nasce a voz rouca de ‘‘Moça Bonita’’, que carrega a interseccionalidade na cor, no gênero e na fome de uma menina de onze anos, que foi mãe aos doze, em um casamento forçado. Uma mulher que é forte, por não ter alternativa nos momentos de fraqueza e choro. Suas lágrimas eram tão anêmicas como Macabea, não por que não quisesse ou precisasse chorar, mas por que não tinha muito tempo para esse luxo. O planeta fome não deixava.

Seu canto e suas letras são vivas, por refletirem uma escravização, supostamente finda, ou uma liberdade ficta fundada na falsidade do mito da democracia racial. Se ela diz que ‘‘A carne mais barata do mercado é a carne negra’’, é por que sem custo é entregue ao cárcere, às covas abertas e as que estão à espera de mais um corpo preto, à escravização moderna dos subempregos e todas as demais instituições totais de privação de liberdade.

A ‘‘Maria da Vila Matilde’’ não é mais a menina-mãe acanhada lá de ‘‘Moça Bonita’’, que foi ridicularizada no programa de Ary Barroso. É a mulher preta liberta, que Mané nenhum ousa levantar a mão, humilhar e/ou ofender. Caso contrário, ela solta o cachorro, joga água fervendo e liga para o 180.

Ela não sucumbiu aos reveses, pediu agô e seguiu em frente, com os caminhos abertos por Exú, que a ensinou nas escolas da vida a pisar ‘‘[...] firme em chão de giz’’. Exú nas escolas tem fome e a quem merece ensina por onde andar. Nas estradas tristes que a morte dos seus se apresentou, ela soube também renascer, pois como diz meu parceiro Mauricio Faísca, ‘‘encruzilhada também é caminho’’.

Elza é mulher preta, que como uma Deus-mãe, abraça toda poesia e epistemologia do universo banto, nagô, ewe-fon, afro-brasileiro em ‘‘seu colo de madona’’. A sexy Yabá, doce e molhada, mistura sem pudor os ‘‘sólidos com líquidos’’, em um banho de cachoeira que brota de si, a sua cachoeira musical, quente e doce. Por que quer fuder, com as unhas cravadas de desejo; ela quer dar para você muito mais que sexo.

Ela oferta a leveza de ser, o direito ao prazer que qualquer pessoa pode desejar e ter.

Ser mulher preta para Elza é ato político de rebeldia constante em sua história de vida. Inspiração feminina que transcende a sua arte, e com esta defende a sua identidade, sua cor, seu gênero e todos aqueles que tiveram que passar pelo fio da fome, como Carolina, Maria... e tantas pretas mãe, mulheres, operárias da vida.

Imagem: Montagem Ciranda.net (Elza Soares - Facebook, Elza Soares recebendo título de embaixadora do samba em 1971- arquivo Biblioteca Nacional)

Audio - Faixa 1 do álbum "Planeta Fome".
Composição: Russo PassaPusso
Elza Soares - Voz
Russo Passapusso – Voz
Voz - Virginia Rodrigues
Roberto Barreto - Guitarra baiana
Junix - Guitarra
Sekobass - Baixo
Japa System – Percussão
Icaro Sá – Percussão
João Meirelles - Synths e programação
Gilmar Chaves Cardoso dos Santos – Trombone
Trompete - Rudney Machado Santos
André Becker Denovaro - Sax alto e Flauta
Vinicius Santos Freitas - Sax Barítono

Ouça aqui: https://ElzaSoares.lnk.to/PlanetaFomeID

LIBERTAÇÃO

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